Recebo com muito júbilo
o laureado fanzine vencedor do prêmio Ângelo Agostini 2012, o quinto número do Quadrante
Sul (21 cm x 15 cm, capa couchê colorida – arte de Carlos Fernando
Ferreira e Marcelo Tomazi – com 32 páginas p&b e tons de cinza). Aliás,
ganhou prêmio de Melhor Fanzine porque, nas palavras do próprio editor Jerônimo
Souza “foi a categoria onde os eleitores conseguiram nos ‘encaixar’ ”.
Começa com o personagem
Predador em ‘O Ritual’, escrita e
ilustrada por Carlos Fernando Ferreira. Um artista de traço belíssimo, na
melhor tradição do conhecido Moebius. São oito páginas de deslumbre visual, mas
confesso que não entendi nada na conclusão, um texto deslocado da história
vista, narrando um fato sórdido que faz o Predador se confessar invejoso de um
índio que acabara de se sacrificar. E o autor da HQ, um desenhista brilhante,
acabou se mostrando um roteirista tão chato quanto Moebius! A intenção é
manjada: expõe-se um fato sórdido cometido por seres humanos brancos, e
exalta-se a ‘pureza’ dos seres humanos índios. Pois eu é que não tenho inveja
de índio nenhum! Fosse o Brasil até hoje dominado pelos índios, e nem uma forma
de escrita teríamos! Pior, se dependêssemos da agricultura devastadora
arrasa-solo que praticavam (que só foi interrompida com auxílio dos jesuítas),
se os europeus não tivessem chegado aqui hoje seríamos um imenso deserto
famélico! E, assim como qualquer ser humano, os índios são capazes de cometer e
perpetrar atos hediondos – basta lembrar do infanticídio que ocorre nos dias de
hoje na tribo dos surwahás, no sudoeste do estado do Amazonas: se o bebê nascer
com algum defeito, azar, é enterrado vivo! E isso ocorrendo com lamentável
omissão de seguidos governos brasileiros!
Mas
deixemos esses índios pra lá, e vamos em frente, comentando esta edição do Quadrante Sul. Após essa triste HQ do Predador temos o ponto alto da
publicação, que é a crônica do calejado fanzineiro Paulo Ricardo Montenegro, de
forma afetiva, contando sobre a cena fanzineira no Rio Grande do Sul –
lembrando que os envolvidos no Quadrante
Sul já vem de longe na cena das publicações alternativas.
A
hora e a vez de um grande mestre dos Quadrinhos brasileiros, Julio Shimamoto,
entrar em cena nesta quinta edição do Quadrante
Sul ilustrando uma HQ com o personagem Bruce,
O Exterminador (criado por Denílson Reis, um dos membros fundadores do Quadrante Sul e editor do longevo
fanzine Tchê): em ‘Praça’ (escrita
por Denílson e Alex Doeppre), Bruce, um mercenário amoral, tem por alvo um
traficante e viciado em crack – a revelação da identidade do contratante do
assassinato é que irá surpreender os leitores. Muito justo que um mercenário
amoral tenha o visual do Che Guevara – que nem precisaria ser contratado para
matar alguém, bastaria esse alguém dizer ‘eu não concordo com você’ e bum!,
tome tiro na nuca! Exagero? Que nada, não leram o livro de Humberto Fontova, ou
viram o documentário produzido por ele? Isso aí é conto de fadas perto do que o
porco fedorento fez em Cuba na vida real.
‘Memórias
de Boxing Joe’ é a história que vem a seguir, escrita por Jerônimo de Souza e
ilustrada por Jonathan Pires, dono de um traço muito bonito. O Boxing Joe do
título é um cara que nasceu sem os braços e sem as pernas mas com um intelecto
descomunal, capaz de inventar as engenhocas mais incríveis para conseguir
sobreviver num mundo dominado por guerras, drogas, gangs e corrupção política.
Hora
& vez dos novos colaboradores do Quadrante Sul apresentando o personagem Eliminador em ‘A Nova Ordem’, HQ escrita
por Fabiano da Costa Höltz e ilustrada por Marcel de Souza. O Eliminador é um jovem vivendo num futuro
dominado por guerras, drogas, gangs e corrupção política...
Após
uma breve apresentação dos colaboradores desta edição, na terceira capa temos uma
HQ de página única chamada ‘Estranhos Prazeres’, produzida pelo ótimo Jader
Correa, uma interessante metáfora sobre a dependência da internet,
especialmente do facebook.
Uma
pena que gente tão talentosa insista em retratar em suas HQs somente o lado
ruim da vida, como se o lado bom não existisse. E olhe que os ‘quadrantes’
originais hoje são pais de família, que progrediram na vida com muito trabalho
e dedicação honesta em seus ofícios. Por mais complicado que seja o nosso país,
o nosso planeta, quem trabalha honestamente, olhando a vida com bons olhos,
progride! Consegue criar filhos e formar família harmoniosa! Mas olha só quem
fala, logo eu que também já produzi coisas horríveis, niilistas, pervertidas,
realmente abomináveis... mas deixei disso, há uma década – basta constatar o
que venho fazendo na Júpiter II. E devemos sempre respeitar a liberdade
criativa dos artistas. Me desculpem o tom rabugento que perpassou toda essa
resenha, que isso não impeça os fiéis seguidores desse blog de conhecer o
valoroso & talentoso trabalho dos artistas do Quadrante Sul. Acessem www.quadrantesul.blogspot.com (JS)