Tony Fernandes é exatamente uma pessoa a quem podemos chamar de valoroso, persistente, incansável produtor de HQs (roteirista, ilustrador, editor). Na virada das décadas 80/90 do século XX, tornou alguns de seus personagens conhecidos & admirados pelos fãs da HQ Brasileira, como Fantasticman e Guerreiro Ninja. Agora Fernandes retorna com nova personagem, em gibi lançado por todo o território nacional: Apache, já com dois números lançados pela Editora das Américas (formatinhos de 42 páginas em tons de cinza). Na melhor tradição das mocinhas do faroeste, Apache é uma jovem e sensual justiceira de chapéu, winchester e colt. No Brasil a melhor lembrança que temos neste estilo é a Katty Apache de Cláudio Seto, só que esta era loira e de poncho gaúcho, enquanto Apache é uma mestiça de mãe índia e pai branco, que ainda criança vê sua aldeia ser massacrada por tropas do exército dos EUA, e agora, disfarçada como freira numa em missão religiosa, parte em vingança dos responsáveis pela morte de seus pais. O que me espantou positivamente, de cara, foi perceber o quanto evoluiu o traço de Fernandes. Tudo feito com muito talento e capricho. A história também é interessante, o erotismo é usado de forma bem discreta (ainda bem!) e o autor vem desenvolvendo roteiro e personagens com muita competência. A única coisa irritante são os textos anti-americanos, geralmente publicados no início e final da HQ. Coisa mais apropriada para diretório acadêmico de faculdade do que para gibi de faroeste. Acho muito improvável que isso vá agradar aos leitores fãs de faroeste, e menos ainda, que vá formar novos leitores do estilo. Os fãs de faroeste em sua maioria sentem mais admiração do que aversão aos EUA. Querem mais é ver aventura de faroeste, como nos filmes, como no Tex, não sei se estão a fim de questionamentos históricos enquanto estão lendo gibis. Reparem só o que vem escrito num texto do número 2: Os livros de História da América (...) jamais registraram massacres efetuados pelo exército, como os de Sand Creek. Equívoco. Nos EUA há uma vasta bibliografia historiográfica a respeito desses assuntos, uma rápida pesquisa no Google vai mostrar. Aqui mesmo no Brasil há livros que registram esses massacres, como Enterrem Meu Coração Na Curva Do Rio e Pés Nus Sobre A Terra Sagrada – a propósito, creio que esses dois são os únicos livros sobre o faroeste traduzidos no Brasil, além daquele livro de Pat Garret sobre seu adorado Billy The Kid, mas este não trata a respeito de índios. O que falta no Brasil são livros que, como outros tantos publicados nos EUA, relatem esse período histórico de modo mais abrangente, relembrando eventos anteriores aos massacres do Exército dos EUA contra os índios, como os genocídios promovidos pelos Apaches contra outras vertentes indígenas – o que desmente de uma vez por todas a falácia de que “os nativos da América viviam em paz uns com os outros antes da chegada do homem branco” – ou os ataques dos índios aos primeiros (e desarmados) colonos. Também outros tantos livros publicados nos EUA comentam sobre as ferozes e destrutivas batalhas entre os nativos da América do Norte e seus primeiros inimigos invasores: os mexicanos. De qualquer forma, o mais importante por aqui é ressaltar a excelente qualidade da HQ, e incentivar para que comprem as edições de Apache, de um autor muitíssimo talentoso. E que nos dá uma notícia irresistível no final do número 2: vem aí uma edição colorida do Fantasticman! Nós fãs de HQB agradecemos, e esperamos ansiosamente.